Ceilândia é uma região administrativa do Distrito Federal, localizada na porção oeste, com 350.347 habitantes. É de lá que é Gina Vieira Ponte, professora referência em educação inclusiva que terá a trajetória retratada em um filme que será lançado nos cinemas de todo o Brasil no próximo ano. O longa-metragem Gina: uma mulher inspiradora apresenta alguns aspectos da vida da ceilandense, passando pela depressão após a perda da mãe, o contato com a professora Creuza, que marcou a infância de Gina e despertou nela o desejo de dar aulas, até a frustração por não se conectar com os alunos e o nascimento do projeto Mulheres Inspiradoras, que lhe rendeu mais de 20 prêmios, entre nacionais e internacionais.
O filme é dirigido pelo cineasta brasiliense Cristiano Vieira. Segundo ele, a ideia da obra surgiu durante uma conversa com a irmã, que é professora em Ceilândia. "Ela mencionou uma colega que estava transformando a dinâmica em sala de aula e rompendo paradigmas no ensino público. Isso despertou meu interesse, pois na produtora Studio 10 Filmes buscamos contar histórias universais a partir de personagens enraizados em Brasília", explica.
Gina recebeu o convite para ter a história retratada em filme com surpresa, gratidão e senso de responsabilidade. Inicialmente, ela resistiu à ideia e não aceitou de imediato, pois temia que a obra não honrasse a memória da mãe Djanira e do pai Moisés tanto quanto gostaria ou que alterasse a compreensão que tem da própria biografia.
Aos poucos, a ideia do filme foi soando familiar para Gina. "O Projeto Mulheres Inspiradoras, que eu criei em 2014, e que também será retratado na obra, é sobre o resgate e o registro da história de mulheres, então, eu comecei a pensar em o quanto seria positivo que o filme permitisse que mães, professoras, donas de casa, estudantes assistissem e pensassem sobre a urgência de se recuperar e documentar a história de mulheres. A ideia de que mulheres com histórias parecidas com a da minha mãe poderiam ver o filme, de se verem representadas e se orgulharem de si mesmas, me agradava muito", relata.
Gina entende que a trajetória dela é representativa da história de muitas brasileiras e brasileiros. "Sou de uma família numerosa, que pertence à classe trabalhadora. Meu pai foi ajudante de pedreiro, vendedor ambulante, auxiliar de serviços gerais. Minha mãe foi lavradora e trabalhadora doméstica. Os dois eram extraordinários e valorizavam a educação como a prioridade máxima de nossas vidas. Usaram tudo o que tinham de recursos, tempo e saúde para garantir o nosso acesso à educação. A história dos dois é a síntese do país desigual que nós somos", cita.
O fato de a produtora ser de Brasília e de Cristiano Vieira ser de Ceilândia e se mostrar genuinamente interessado e comovido pela história dela também foi um estímulo para que Gina aceitasse o convite. "Eu amo esta cidade e gosto da ideia de que o filme, no fim das contas, também vai apresentar o Distrito Federal para o país", declara.
Gina leu três versões até chegar ao roteiro final, mas teve acesso apenas aos diálogos entre os personagens. O filme em si, ela só vai saber como será quando estiver finalizado. O diretor disse que a obra foi filmada de outubro até início de novembro. Ainda faltam cerca de 10% de imagens a serem produzidas — processo que deve ocorrer em fevereiro de 2025.
Para o cineasta Cristiano, a história da Gina representa a força transformadora da educação e o poder do educador de marcar vidas, mesmo em contextos desafiadores. "Para além dessa história de superação, também fala da importância do papel do professor em buscar se conectar com os alunos para gerar uma ambiente de troca e confiança, além de discutir o modelo de ensino tradicional com reprodução de cópias, que prioriza a memorização mecânica em detrimento de uma aprendizagem ativa", destaca o brasiliense.
O desejo de Gina é que o filme estimule reflexões e debates sobre as vivências de pessoas negras, das mães da periferia que lutam pela educação dos filhos e dos educadores que trabalham por uma educação que seja integral, crítica e emancipadora. Ela também espera que a obra apresente a importância de valorizar a carreira docente e a necessidade de fortalecimento da escola pública.
"É impossível contar a história de uma pessoa negra no Brasil sem que haja uma referência contundente ao racismo. Isto aparece de forma transversal ao filme, e é um elemento decisivo na constituição da personagem. Eu desejo muito que a obra colabore para a qualificação do debate sobre a urgência de se promover a equidade étnico racial", diz Gina.
A ceilandense avalia que a arte consegue dizer com maestria o que a educação precisa falar. De acordo com ela, o cinema dispõe de recursos que acionam não só o pensar, mas também o sentir, e é capaz de transformar a mentalidade das pessoas. "Não acredito em qualquer forma de educação que não dialogue com a arte e a cultura. Como diz a grande Fernanda Montenegro: 'A educação sem cultura é um esqueleto sem musculatura'. O cinema é uma ferramenta poderosa para a educação", ressalta.
A obra não será um documentário, mas, sim, um filme de ficção. Nesse sentido, Gina autorizou Cristiano a usar a licença poética para fazer um longa-metragem que conte a história de forma coesa e verossímil, que permita às pessoas se identificarem com os personagens. "O que estará representado será um compilado, um recorte do que eu vivi ao longo dos meus 30 anos de professora e 52 anos de vida. Espero que, de onde estiverem, dona Djanira e seu Moisés sintam orgulho do legado que eles deixaram", frisa Gina.
Com informações e imagens: Correio braziliense / Divulgação - Carlos Terrana / Minervino Júnior - CB - D.A.Press